Agourosto

Quando Deuz cansou de contar estrelas, decidiu sair do tédio e construir céus e terras em sete dias. Arregaçou as mangas de algodão cru e prendeu os dread locks. Sim, Deuz sempre foi roots.

Enquanto isso, seu irmão Demus, tratou de embirrar:

“Tu vai mesmo criar uma bola de terra?” – e riu gostosamente.

Demus era baixinho e entrucado. Metade do corpo era de bode, e a outra metade de borracha vermelha. “Bondage” brincava enquanto passava óleo na testa. Seu negócio era brilhar, adorava o efeito do óleo na pele cor-salsicha.

Deuz seguia o plano de criar o mundo e começou pelo jardim. Como sempre curtiu as palavras com a letra E, pensou em Éden e ficou. Gabrieldo, um anjo peralta, visitava a terra vez em quando, ali mesmo pelas nuvens. E um dia ficou apertado demais, fez xixi lá de cima, acabou molhando uma plantinha.

Foi a primeira chuva do planeta.

A chuva fez a planta crescer e ficar cauluda. Era a primeira gameleira.

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Demus era criativo e gostava de contrariar a calmaria de Deuz. Pra pertubá-lo ainda mais, criou coisinhas… chamou-as de formigas-de-fogo. Depois outras coisas: baratas, a caspa, a fome e os emos.

“Se queres tanto chamar minha atenção, porque não me ajuda a bolar uma forma de separar aquilo que mais tarde os homens vão chamar de tempo?” – disse o roots.

E assim vieram horas, segundos, minutos, dias, períodos, anos bissextos e estações. Estava tudo ali redondinho. A cobrança do irmão despertou a colaboração do outro. Seguiram nas invenções: cavernas, mel, copaíba e urucum.

Simples assim, os dois balançavam as mãos e iam criando as coisas. Metade pirlimpimpim, metade brujaria.

Mesmo com a divisão dos tempos, faltava algo. Deuz queria período de dias e Demus achava que tava bão assim. Brigaram em cima das nuvens. Raios e Trovões. Os primeiros também.

Gabrieldo chegou pra acalmar e deu a ideia:

- Deuz separa os dias, Demus nomeia e ambos classificam.

E ficou:

De JANEIRO À DEZEMBRO, só amor. Onze meses de amor e paz mundial.

O emborrachado deu um pulo, ficou irritadicíssimo:

“E tu quer manter a ordem como? tudo na paz? tudinho?” e gritou “ EU QUERO É VER O OCO!”.

Deuz saiu do seu momento zen, estava fazendo ioga enquanto seu irmão se descabelava tentando arranjar um mês pra brincar de fazer mal.

“Seguinte: vou arredondar. Serão agora doze meses, e não me encha a paciência” – Disse enquanto fazia a posição Fulô de Lótus, com seus dreads loiro acinzentados galácticos.

Demus bateu os cascos três vezes na terra. E vieram: seis urubus. Três de cada lado, traziam amarrados em suas garras uma linha, quase invisível. Era uma enorme faixa em branco.

“Você é muito espetaculoso irmão!” – falou Deuz, enquanto ria. O outro piscou e disse que tinha estilo.

Pensando em como chamar o mês em que faria a festa, com muito drama, coisa ruim, novidades bombásticas, calor e frio… pensou em algo dramático:

“vai ser AGOUROSTO!” – gritou enquanto olhava pros lados, já esperando a risada implicante de seu companheiro. E ela não demorou. E brigaram de novo, dessa vez Demus batia forte no chão. Terremotos.

“Faz assim: cria duas palavras. Agos…Arouto, Agosto! e Agouro. Sei lá! Mas usa uma pro mês e outra pra dizer o que vai ser o mês, ué” - aconselhou o grisalho.

Ele sempre foi O cabeça, todos sabem.

“VAI SER AGOSTO!” e comemorou finalmente o seu mês. Agosto era o nome dele, e sempre seria, a não ser pelas traduções e tal. Agouro era o que o mês teria. Representaria o terror antes do mês seguinte: setembro, um dos preferidos do irmão. Seria o divisor de águas das relações, o mês mais intenso e extenso. Salários atrasariam, carros seriam amassados e cabelos mal cortados.

Os irmãos entraram em acordo, porém os humanos nunca souberam. Revelo-lhes então como nasceu o mês contraditório. É um agouro, a gosto.

Imagem:

Viaggi mentali che portano pensieri filosofici

4 comentários:

Patrycia disse...

Muito bom, Nana!
Também tenho um blog, mas de comida, histórias e lembranças.
Passa lá se der vontade, é o www.mesanafloresta.blogspot.com,
um beijão,

Patrycia

Nanapocket disse...

Obrigada Patrycia :)
Retribuirei a visita!

Paulo Cesar disse...

Porra que texto do caralho :) ta ficando ninja

Tiago sem agá Teles disse...

Só uma coisa pra dizer: SENSACIONAL!
Fico fascinado com essa "cabeçona pensativa criativamente" e como tu monta essas teorias e faz fazer um baita sentido.

Obrigado por me fazer sentir menos sozinho nesse mundo tão quadrado.

:*