Habitual. Peguei o ônibus das seis naquele inferno público que chamam de terminal urbano. Sentei no segundo banco à esquerda da porta do meio. Quase todos os bancos estavam ocupados, mas ao meu lado ainda restava um espaço e rumo à universidade, coloquei as melhores músicas e tentei evitar as tristes, até que começou a tocar aquela do Neil Young e eu desisti.
- Deixa a tristeza existir, pensei.
Gosto de encaixar a cidade na música, e enquanto tentava organizar os pensamentos fui olhando o percurso como uma turista. Segui. Enquanto pensava numa maneira de transformar o nada em dinheiro, que por sinal ando precisando, percebi o ônibus ficando um pouco mais lotado, mas ainda nada especialmente cheio para aquela sexta-feira.
Um homem veio em minha direção, mas não antes de observar que além do meu banco vago não havia outra opção. E eu percebi que eu tinha sido a escolhida para dividir o mesmo ar que aquele cara de quase dois metros. Eu estava concentrada no lance da tristeza e acho que ele percebeu.
- Tudo bem, senta aí.
(pensei mas não disse)
Ele sentou. Olhou pra mim, pro meu celular e pegou o dele.
Foi uma sexta-feira esquisita, daquelas que você não sabe o rumo das coisas. Se vai se fica, se dá ou desce. E eu estava nublada. Eu quase via minha fumaça esvair do meu corpo e denunciar a confusão ali. Eu quase via mesmo. Uma coisa turva e cinza produzida pelos meus pensamentos e alimentadas pelas dúvidas. Cada dúvida era como um incenso ruim, desses que não são indianos de verdade, que ia acendendo e deixando tudo embaçado e os olhos marejados e os pulmões cansados.
Pois bem, o cara.
Depois de mexer no próprio celular por uns cinco minutos, percebeu uma cadeira vazia. Ele estava ali e depois de sentir minha alma turva, não ficou mais.
Trocou de lugar. Eu achei que não estava tão ruim, mas después dessa, tive certeza. Melhor melhorar.
Imagem: Tumblr Hold me Close
Som: O Triunfo de Salomão – A Banda de Joseph Tourton
Nenhum comentário:
Postar um comentário